quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Meu velho curador


Sob o peso da palha que lhe encobre as feridas, caminha o velho. 

Pé ante pé, a cada passo uma dor. 

Caminhar é uma dor.

Existir machuca. 

Destrói. 

A dor é o caminho. A dor é um moinho.

A dor é também só dor. 

Diante dela: sofrimento ou movimento.

A ambos o velho conhece. Em ambos já caminhou. Salve o grande senhor do tempo! 

Tempo pesado. Tempo arrastado. Tempo transformador. 

Independente do caminho escolhido, lá estará sempre ele, com a paciência de quem muito já andou.

Foi no caminho da dor que meu velho Omolú aprendeu a transformar suas feridas em amor. 

Foi no caminho da dor que nasceu o curador.

Atotô.

Viva o amor!


Acabasse o amor
Roubado seria 
Nosso último suspiro

Sucumbiríamos todos
Trôpegos e cambaleantes 
Em nosso próprio torpor

Apagada fosse essa chama 
Graça alguma restaria
Na poesia esvoaçante
Do singelo beija flor

Viva o amor!
Sinta o amor!
Coração vivo e afinado 
Com a batida do tambor

Alma militante


Quanto maior a ferida da alma
Maior a capacidade de arrebanhar-se 
Ideologias vãs 
Meras idealizações 
A forjar com orgulho
Medos, culpas, aflições 

Curar a si é um ato de liberdade
Abandonar-se a própria sorte 
Sabendo que cada giro da vida
Faz nascer novas verdades
Deixando para trás corpos e memórias 
Na roda gigante da morte

Permitir-se transformar
É não ter o que seguir
Seguir vivente e errante
Cultuando o presente
Desistindo da luta
Para renascer amante

Soltar o ressentimento militante
Que violenta amigos e inimigos 
No julgamento ultrajante
De uma esperança arrogante 
Que vê o sumo bem do mundo
No espelho de um umbigo dolorido

Não se assuste, querida!


Não se assuste, querida! 
O amor é azul
Da cor das águas do mar
Coração de Iemanjá 

Não se assuste, querida!
O amor balança 
Lançado foi
O barco ao mar

Mas não se assuste, querida!
O amor é encanto
E  como seu próprio canto
Canto de sereia

Não, não se assuste, querida!
O amor é instante
Presença fulgurante 
Da luz divina

Oh, não se assuste, querida!
O amor é brisa marinha
À sussurrar no ouvido
Os segredos da rainha

Ouve o canto do amor
Deixa a saia rodar
Baila com teu marinheiro 
Nas ondas desse mar

Odoyá

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Sintonia


Foi só quando senti
Que desisti de decidir
E parti 
Para não mais dividir 
O aqui

Foi quando me abri
Que se desenhou o meu devir
E para à alma não mentir
Aprendi a transgredir 
E sobrevivi

Foi por aqui e por ali
Nas alturas e no breu
Que sentindo
Encontrei muitos dos meus eus
E acolhi 

Senti e sigo sentindo
E sinto tanto
Que já não sei se sou eu que sinto
Ou se vivo sintomas de sintonia
Sinto muito