quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Autismo, Explosões Solares e a Escola


          Outro dia, toca o telefone e, quando atendo, uma grata surpresa. Do outro lado da linha, uma professora da época em que estava na faculdade. Professora, não. Uma grande amiga e grande irmã com quem tive a oportunidade de compartilhar momentos muito preciosos da minha vida.

          Animada, como sempre, contava que, agora, estava iniciando uma nova etapa em sua vida. Começaria a trabalhar com os filhos dos funcionários da universidade portadores de alguma diferença e, geralmente, denominados por nós – os iguais! – como pessoas especiais.

          Estava radiante! Contava o quanto esperava aprender com aqueles serezinhos, que, segundo ela, se manifestavam de maneira absolutamente verdadeira e espontânea.  Pediu–me também que escrevesse um texto para a divulgação do curso.

          O texto acabou nunca rolando, mas o fato é que – papo vai, papo vem e, em meio àquela delícia toda de reencontro – ela solta, sem cerimônia, como lhe é peculiar, uma bomba que está  explodindo na minha cabeça até hoje.

          Disse ela – e eu não tenho a menor ideia da fonte – que até o ano de dois mil e alguma coisa – não lembro o ano, mas lembro que era uma data relativamente próxima -, cinquenta por cento das crianças nasceria com AUTISMO.

          Pausa.

          Num outro dia, vendo vídeos sobre agrofloresta na internet, deparo-me com Ernst Gotsch, que, ao responder uma pergunta, que, pela baixa qualidade do vídeo,  não consegui ouvir, afirmava que somente algo de caráter absolutamente inesperado e imprevisível  poderia mudar de maneira rápida a dinâmica de vida do homem na Terra.

          Ernst estava faltando de explosões solares. Segundo ele, uma dessa explosões, dependendo da intensidade, poderia provocar um colapso em nosso sistema elétrico.

          Já imaginou a geração do iPhone passando, de uma hora para outra, a habitar um mundo sem energia elétrica?

          Sim, malandro. Sem nada! Sem sistema bancário, inclusive.

          Tenso.

          Possível.

          E imprevisível.

          Tranquilo. Mas, voltando à professora, que caceta tem a ver explosão solar com autismo?

          Tudo.

          Nas duas histórias, o que os personagens trazem para reflexão são as possibilidades de surgimento  de novas formas de ser, criadas a partir de novas interações. Novos mundos!

          Mundos onde, certamente, a nossa normalidade  cotidiana seria vista com bastante estranhamento. Afinal, num mundo onde a maior parte da população passa a ser autista, os autistas passamos  ser “nozes”. Ou, se preferirem embarcar na aventura do Ernst, seríamos obrigados a nos deparar e perceber que, praticamente, todo o conhecimento que acumulamos até aqui, para muito pouco nos serviria num mundo sem energia elétrica.

          Por outro lado, ainda nos descobriríamos totalmente ignorantes em relação àquilo tudo que é  essencial à vida e à conservação da espécie: construção de abrigo, produção de alimentos e produção de energia, basicamente.

          Diante desse choque, eu – como professor –, não poderia deixar de ser, imediatamente, levado a dois questionamentos:

          O primeiro é  que, se o mais básico da vida – que é aprender a lidar com a diferença e ter condições mínimas de uma existência sustentável  - as crianças e jovens não estão aprendendo na escola, o que será que estão fazendo lá?  Por quê?

          E, por fim, um exercício de imaginação:

          Pense. Só pense numa “escola” em um mundo onde a maior parte da população é autista.

          Agora, pense. Apenas pense numa “escola” em um mundo onde a energia elétrica deixou de ser viável abruptamente.

          Fiquemos em paz...

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Filosofia: Um Caminho Iniciático


Outro dia recebi uma mensagem de uma grande amiga-irmã, professora, pedindo meu auxílio para seu projeto de desenvolvimento de uma sala do conhecimento na escola. A mensagem dizia o seguinte:

Te mandei um email sobre uma sala do conhecimento. Sei que vc é contra o conhecimento. Tá em toda parte e tal, mas se tiver alguma coisa, me ajuda vai!

Por alguns segundos, fiquei a me perguntar se ela realmente achava que eu era contra o conhecimento ou se estava só me dando aquela sacaneada devido às nossas meia dúzia de divergências em relação ao processo educacional.

Concluí que era sacanagem. Mas, quando percebi, a questão já tinha grudado na cabeça: Sou contra o conhecimento? Qual é o tipo de conhecimento em que, realmente, eu acredito?

E comecei a fazer uma viagem ao longo de todo meu processo de busca de conhecimento, passando pela forma(ta)ção acadêmica até o dia de hoje, momento da vida em que creio que a Filosofia mais bela se faz no interior do próprio homem.

De fato, não acredito em acúmulo de informação como conhecimento. Conhecer não é um ato de consumo. Conhecer é relacionar-se. Relacionar-se com o outro e consigo mesmo antes de tudo.

Por isso, sempre digo aos meus alunos que meu trabalho é uma fraude. Não existe professor de filosofia. A Filosofia não pode ser ensinada. Não é um conteúdo. Ela deve ser vivida, experimentada e saboreada na descoberta de si mesmo e do mundo.

A Filosofia é um processo iniciático. Na Grécia Antiga, os aristocratas entregavam seus filhos para serem educados pelos filósofos. E, nesse caso, o filósofo não era, certamente, um professor que lecionava mais uma matéria aleatória. Era um mestre que tinha como missão orientar seus discípulos na busca pelo conhecimento em diversas áreas da vida, sendo responsável, em muitos casos, inclusive, pela iniciação sexual de seus discípulos – a famosa prática da paiderastia grega.

E lançar-se na jornada do conhecimento é, sempre, um caminho sem volta. Se, por um lado, acumular informação, cultura – em termos estritos – e erudição não tem o poder de, num sentido mais substancial, mudar a vida de alguém, por outro, o conhecimento que brota de dentro transforma profundamente o ser. É a nossa Luz mais brilhante, que clareia nossa estrada e aponta novos caminhos.

Por isso, hoje, creio que a real Filosofia – aquela que está conectada com o fluxo do universo e da vida – nada mais é do que o processo de tomada de consciência da realidade pelo homem em sua experiência humana. E pasme! É possível tomar consciência do real sem nunca ter lido uma linha de Kant ou Hegel! Aliás, pelo caminho, já encontrei muito filósofo analfabeto e iletrado. Agricultores, jardineiros, mendigos, bêbados, traficantes e muitos outros seres que receberam a picada do vagalume e nunca mais deixaram de buscar a luz.

Gratidão, Luisa, pela mensagem. Por ter me proporcionado olhar de maneira ampliada o que a Filosofia representa na minha vida enquanto buscador e, sobretudo, a enorme responsabilidade que, enquanto filósofo, sobre mim recai no compartilhar da existência.


Te amo! 

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Na trilha do Perdão com destino ao Feminino


Gaia vive um momento de despertar do feminino. Isso não tem, necessariamente, a ver com homens e mulheres e suas histórias individuais. É um processo natural do nosso ciclo cósmico em busca de equilíbrio. Também não está ligado ao feminismo ou qualquer outra ideologia.

            Estamos num ponto de inflexão, onde uma energia começa, lentamente, a se retrair e a outra – o princípio feminino – inicia seu movimento de expansão.

            O movimento não acontece da noite para o dia. Ainda há muito karma individual e coletivo para ser queimado até que um novo padrão de comportamento humano se estabeleça como expressão da expansão do aspecto feminino da nossa realidade.

            Nesse processo de queima de karma muita coisa precisará ser purgada e expelida da Terra. Não há, entretanto, razão para desespero. Quem estiver conectado com o seu próprio ser, estará também amparado por outros seres de luz que nos conduzirão por todo o processo. Essa fase de transição limpará os nossos corações de dores e feridas profundas que, por várias vidas, tem nos impedido de ver quem somos e seguir adiante em nossa jornada da consciência.

            Quando, então, o PERDÃO – por todos os excessos que foram cometidos ao longo de uma era pela ignorância da própria humanidade em lidar com a energia masculina – for, enfim, liberado, o feminino florescerá e viveremos um período áureo em nossa ascensão.

            Entendamos, uma vez mais, que masculino e feminino, antes de ser uma questão de gênero, é uma questão energética. E uma questão central nesse mundo onde tudo o que se manifesta, se manifesta dentro de um princípio de dualidade.

            Portanto, ainda que um homem jamais possa ser um feminista, nada o impede de despertar dentro de si seu aspecto feminino. Do mesmo modo, nada impede uma mulher de acessar seu masculino, perdoá-lo quando necessário e, a partir dessa liberdade, conectar-se de maneira saudável e equilibrada com ambos os polos que possibilitam sua manifestação como um ente dessa dimensão.

            Sigamos com atenção, evitando os julgamentos e acolhendo, com gratidão, tudo o que nos chega através da realidade que temos criado. É tempo de iluminar nossas sombras com a luz da honestidade e dissolver por completo toda a ilusão da separatividade.
            
                  Que Gaia nos conduza em seu infinito Amor!








segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

O velho Newton, o novo mundo e a greve da educação


Para toda ação corresponde uma reação de mesma direção e sentido contrário. Dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço e, muito menos, o mesmo corpo ocupar lugares distintos. É o que todos nós aprendemos na escola. Fomos treinados na dinâmica do “faça isso e acontecerá aquilo!”. Essa matriz de pensamento é a que, durante muito tempo, serviu para pautar nossa ação no mundo e moldou nossa maneira de enxergá-lo.

Contudo, com o pujante despertar de consciência pelo qual o planeta vem passando, refletido, inclusive, no campo científico – onde as novas descobertas jogaram por terra todo nosso limitadíssimo conceito de espaço-tempo –, essa abordagem vai se tornando cada dia mais obsoleta.

Finalmente, parece que a ciência começa a admitir o que sempre fora uma realidade para as diversas tradições religiosas: a não objetividade da vida e a existência não mais como um fenômeno linear, mas multidimensional, composto por uma teia de infinitas relações que vão muito além de qualquer dialética reducionista.

Descobertas incríveis que começam a abalar não só tudo aquilo que pensamos a respeito do mundo e da sociedade por séculos, mas que nos lançam um novo desafio: como lidar com esse novo mundo que segue se desenhando? Como nos conectarmos de maneira positiva e afirmativa nessa relação autopoiética que é a construção do nosso ser no mundo?

Certamente, as respostas ainda não existem. E, por um motivo bastante óbvio. Nós somos a resposta. Como todo período de transição, é necessário um tempo para nos adaptarmos ao conhecimento que nos chega e traduzi-lo em ação na solidez da terra. Por isso, CRISE! Palavra que tem circulado amplamente nos meios de comunicação e nas conversas de botequim, mas, geralmente, muito mal compreendida.

Como várias culturas antigas nos ensinam, crise é um tempo de oportunidade. Assim como quando ficamos doentes recebemos do universo a chance de nos retirarmos um pouco de nossas atividades corriqueiras para observar o que o corpo está nos comunicando, um tempo de crise é – antes de tudo – um tempo de reflexão. Um tempo onde temos a oportunidade de ponderar, num nível mais amplo, onde e porque estamos doentes enquanto sociedade.

Para uns, crise econômica. Para outros, crise moral. Ambas as abordagens, entretanto, parecem não dar conta da questão.

Economicamente, fomos adestrados na escassez. Nos contaram que os recursos são escassos e que não há para todo mundo. É a base da própria ciência econômica. Uma mentira afirmada muitas vezes que serve para sustentar nosso Contrato Social, a mentira subsequente que dela decorre. Afinal, num ambiente onde não há recursos para todos, os homens entram em estado de guerra e, consequentemente, justifica-se a dominação de um poder superior que, heroicamente, nos livrará da nossa própria animalidade: nosso amiguinho, o Estado!

Do ponto de vista moral, a historinha também não é lá das mais interessantes nem convincentes. O mundo é dividido entre pessoas de bem e pessoas do mal. Eu, minha família e meus amigos somos representantes da verdade, da lealdade e dos bons costumes. Se estivéssemos no poder, certamente, o país – ou o mundo – seria diferente. O resto é corrupto e safado. Todos deveriam ser condenados a morrer fritos numa panela de óleo quente. Apesar de raso, é um pensamente que permite que minha consciência siga dormindo tranquila em seu sono profundo. E desempenha um papel importantíssimo na conservação do status quo.

Nos dois casos a estrutura do problema não é alcançada. E digo estrutura porque, sim, não creio que a crise que vivemos seja de natureza conjuntural. Ela é profunda e toca no âmago da nossa estruturação social – para não dizer humana.

Durante séculos, abrimos mão da nossa humanidade e delegamos às instituições a responsabilidade por nossas vidas. Como crianças que éramos – de um ponto de vista consciencial –, necessitamos por muito tempo de figuras paternas que nos conduzissem e nos dissessem por onde deveríamos ir. Entregamos nosso poder pessoal e social ao Estado e criamos um monstro que passou a nos dominar.

Num determinado momento da história, nos tornamos adolescentes, descobrimos as cadeias que nos oprimiam e sonhamos com a liberdade. Nos rebelamos. Fomos de encontro às garras do Leviatã, acreditando que seríamos vitoriosos. Algumas conquistas pontuais foram feitas, mas a energia despendida e o sacrifício – de vidas, inclusive – foram enormes.

E agora, nesse momento-chave em que vivemos, tenho a impressão de que começamos a ingressar em nossa fase adulta. E tornar-se adulto, em termos políticos, é um salto. Um salto da culpabilização do Outro para a responsabilização do Eu. Não há liberdade maior que essa.

Sou professor. Professor de Filosofia numa instituição social chamada Escola. No desempenho desse papel – que mistura-se de maneira indiscernível com aquilo que entendo ser, hoje, minha missão existencial – tomo muito cuidado para não ensinar nada àqueles que são chamados de meus alunos. Não acho que ensinar seja a minha função. Ensino é colonização. É opressão. É algo imposto de fora para dentro. É fruto da demanda de uma sociedade moribunda que alimenta sua própria doença.

Meu papel como professor é expor-me ao relacionamento com aqueles seres com os quais tanto eu aprendo. Meu trabalho na escola não se diferencia do meu trabalho fora da escola. Só tenho, de fato, uma coisa a realizar na vida: ser humano. Sendo humano na convivência com eles, tenho a oportunidade de experienciar um ambiente de Verdade, que, de maneira muito natural, acaba constituindo-se num terreno fértil para a aprendizagem.

E aprendizagem é algo que, além de relacionamento, fala de paixão. O aprender é um fenômeno humano que, ao contrário do que nos ensinaram na escola e na universidade, não se fundamenta na razão, mas na vontade. Ninguém aprende algo contra sua vontade. O grande desafio de qualquer educador reside, “simplesmente”, em criar ambientes onde essa vontade possa se sentir realmente livre e o ser possa entrar em contato com a sua paixão. Dado esse start, nesse mundo onde a informação já circula livremente, o professor vai se tornando uma figura cada vez mais desnecessária e o aluno vai desenvolvendo seu ser de forma autônoma.

E é impossível desenvolver a responsabilidade que caracteriza e que dá sustentação a um existir maduro – seja individual ou socialmente – sem essa autonomia. Nesse sentido, tenho plena consciência de que, apesar de trabalhar numa instituição de ensino pública, meu papel ali dentro não visa fortalecê-la, mas destruí-la. Visa colaborar, de alguma maneira, para o desenvolvimento de seres autônomos que, no desenrolar natural de suas vidas, ajudarão a construir uma sociedade mais justa e mais livre, não a partir de instituições boazinhas, mas da justiça e da liberdade que, potencialmente, poderá vir a surgir como fruto de sua conexão com o mundo. Visa cooperar na construção de uma sociedade em que a própria escola desaparecerá e que o conhecimento será novamente reconhecido como livre.

Como educador, nesse momento em que a educação no Brasil e, especialmente no meu estado – o Rio de Janeiro – passa por um processo de convalescência, não posso deixar de admitir que diluída em minha tristeza há um bocado de alegria. Apesar de ter necessidades materiais e desejar ser remunerado de maneira digna e ter condições de trabalho coerentes com a natureza da função que desempenho, tenho a clareza de que apenas isso não resolveria o problema da educação no Brasil hoje. Fico feliz porque essa crise faz brilhar em mim a esperança de um ambiente educacional mais adequado às demandas do novo tempo que vem surgindo.

Penso que a greve dos profissionais da educação – acho esse termo horrível! – é um movimento justo e que merece todo o nosso respeito. Mas, acho pouco. Se o professor fosse remunerado como um parlamentar e a escola tivesse infraestrutura de gabinete político, a educação continuaria perversa e excludente – os conselhos de classe continuariam existindo! Afinal, embora o dinheiro seja uma energia necessária à vida na matéria, educação não se faz só com dinheiro. Educação é fruto de amor. Fruto do transbordamento daqueles que, pelo caminho, encontraram algo que julgaram valer a pena compartilhar com o outro.

Nesse sentido, embora a paralisação seja fundamental – reafirmo! – para aqueles que assim desejam expressar sua insatisfação com o atual estado de coisas, creio que a revolução mais profunda seguirá seu caminho solitário e silencioso, independente dos movimentos de massa. Seguirá no interior de cada um e se expressará no dia-a-dia do relacionamento professor-aluno.

E nesse momento de ânimos exaltados, meu desejo é que a nossa maior greve seja a de rancor. Que possamos nos lembrar sempre que o Estado, assim como qualquer outra instituição, não tem existência própria. É apenas reflexo de quem somos enquanto indivíduos e enquanto sociedade. Que sigamos nosso caminho com honestidade existencial e aos mais ousados, uma sugestão: amemo-nos e curemo-nos. Educar é doar-se. Não há conteúdo mais elevado a ser transmitido do que aquilo que somos. Que sejamos boas oferendas àqueles que cruzam nossos caminhos!